Sexto Domingo depois da Páscoa – Pe. Júlio Maria, S.D.N.

Duccio di Buoninsegna, Maestà, Cristo se despedindo dos apóstolos, entre 1308 e 1311, domínio público, Wikimedia Commons

Sexto Domingo depois da Páscoa (Jo. 15, 26-27; 16, 1-4).

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos:

26. Quando vier o Consolador, que eu vos enviarei da parte do Pai, o Espírito da Verdade, que procede do Pai – esse dará testemunho de mim.
27. E também vós dareis testemunho de mim, porque estais comigo desde o princípio.
1. Tenho-vos dito estas coisas, para que não vos escandalizeis.
2. Expulsar-vos-ão das sinagogas; e virá a hora em que todo aquele que vos matar julgará prestar um serviço a Deus.
3. Desta forma vos hão de tratar, porque não conhecem nem o meu Pai, nem a mim.
4. Ora, disse-vos estas coisas, para que, quando chegar essa hora, vos lembreis de que eu vo-las disse.

OS MÁRTIRES

O Evangelho de hoje nos revela uma das notas características da verdadeira Religião: o martírio.

Jesus diz aos Apóstolos que, depois de terem recebido o Espírito Santo, haviam de dar testemunho dEle, e determina a espécie de testemunho que deles espera: o martírio: Virá a hora em que todo aquele que vos matar, julgará prestar um serviço a Deus.

Vejamos, pois, hoje:

  1. AS PERSEGUIÇÕES e os mártires.
  2. O VALOR DO TESTEMUNHO dos mártires.

I. AS PERSEGUIÇÕES E OS MÁRTIRES

São conhecidas as grandes e bárbaras perseguições dos primeiros séculos e o número quase incalculável de mártires que deram a vida em testemunho da sua fé.

É uma prova sem réplica da divindade da Religião Católica.

“Acredito de boa vontade em testemunhas que se deixam matar”, dizia Pascal.

O paganismo, abalado em suas superstições pela fé intrépida dos discípulos de Jesus Cristo, dirigiu contra estes todo o ódio e a força de um poder despótico.

Daí uma perseguição quase contínua durante os primeiros séculos, desde Nero, no ano 64, até Diocleciano, em 313. Escritores pagãos e cristãos são unânimes em atestar a duração e a intensidade destas perseguições, que fizeram mais de treze milhões de vítimas. Os catálogos são incompletos e, apesar disso, os escritores avaliam em treze milhões os mártires dos cinco primeiros séculos.

Latâncio escreveu nesse tempo: Toda a terra se achava cruelmente atormentada.

Eusébio, outro historiador da época diz: É impossível fazer-se uma idéia da multidão que sucumbiu por toda a parte.

O imperador Diocleciano mandou até erigir uma coluna com esta inscrição: Nomine christianorum deleto. O nome dos cristãos está destruído.

Eis os fatos, mas estes fatos adquirem um valor probativo extraordinário, lembrando-se que tais perseguições e estes martírios foram preditos.

No Evangelho da ascensão, Jesus predisse aos Apóstolos que fariam milagres estupendos para converter o mundo; e hoje Ele lhes anuncia as perseguições e o martírio.

Como conciliar estes dois fatos?

Humanamente é impossível.

Farão milagres; e estes milagres atrair-lhes-ão perseguições!

Curarão os enfermos, ressuscitarão mortos, e não poderão impedir que eles mesmos sejam feridos e condenados à morte!

Coisa estranha! E ambas as profecias realizaram-se ao pé da letra.

Da propagação maravilhosa do Evangelho, devemos concluir que esta Religião é divina.

Das perseguições e do martírio dos discípulos deste Evangelho, devemos também concluir que esta Religião é divina.

É a prova e a contraprova, completando-se divinamente.

II. VALOR DO TESTEMUNHO DOS MÁRTIRES

Durante três séculos, treze milhões de cristãos de todas as idades, de ambos os sexos, de todas as condições, no meio de horríveis suplícios sacrificaram livremente a vida, quando com uma única palavra podiam salvá-la; sacrificaram-na, calma e refletidamente, sem interesse pessoal, unicamente pela fé e por Deus, a favor da religião que professavam.

Será isso natural?

Nunca!

Quem pode inspirar tamanha coragem unida a tantas virtudes?

É o caso de dirimir toda discussão, com o argumento de Tertuliano: “É incrível, logo é divino!” ou o parecer de Pascal: “Tenho fé em testemunhas que se deixam matar para sustentar a deposição!”

Sim, a Religião que inspira tais convicções e coragens não pode vir senão de Deus.

Não objetem que todas as religiões tiveram os seus mártires.

Seria uma objeção que denota ignorância completa da história.

Tais pretensos mártires que os protestantes, maometanos e até idólatras nos apresentam, nada têm de comum com os mártires do catolicismo.

Se consultarmos a história imparcial (não a de César Cantú, falsificada) veremos que o protestante morre com o ódio no coração, o maometano com a espada na mão, o indu com a superstição no espírito.

O primeiro armou-se em ódio à Igreja Católica; o segundo, por desejo de conquista; o terceiro, por orgulho, ou por ambição, mas nenhum deles dá a sua vida por uma crença, pela verdade ou pela virtude.

São fanáticos obcecados, são ambiciosos: não são mártires, e nada têm de comum com as nossas virgens, com os nossos confessores, com os nossos santos, que dão a vida para conservar a sua virtude, a sua fé, e provar o seu amor a Deus.

Há neste modo de morrer a marca do sobrenatural e o sinal de uma intervenção divina em favor da Religião que professam, que defendem e para a qual se sacrificam.

III. CONCLUSÃO

Para resumir estas provas do martírio, em prol da divindade da religião católica, notemos que estes heróis não deram a sua vida em testemunho de uma idéia, mas sim de um fato.

Morrer em defesa de uma idéia não é um argumento decisivo em favor desta idéia, pois alguém pode ficar convencido de uma idéia falsa, que julga certa. Morrendo para tal idéia, este homem dá testemunho de sua boa fé, e nada mais.

Mas morrer em defesa de um fato é outra coisa. Os Apóstolos respondiam muito bem aos fariseus que lhes proibiam falar em nome de Jesus Cristo: Não podemos calar o que temos visto e ouvido.

Viram fatos, milagres, ouviram doutrinas; e é disso que dão testemunho, selando estes testemunhos com o seu próprio sangue.

No testemunho dos mártires, trata-se de fatos: do fato da vida, santidade e ensinos de Jesus Cristo, e para testemunha estes fatos, o mártir dá o seu sangue.

Este sangue é uma voz que clama mais alto que o sangue de Abel: é a voz da fidelidade e do amor.

Fidelidade à Religião de Jesus Cristo, como sendo a única divina. Amor a Jesus Cristo, que merece ser amado acima da própria vida. A Religião que inspira tal heroísmo é uma Religião divina.

Comentário Dogmático, Padre Júlio Maria, S.D.N., 1958.

Última atualização do artigo em 13 de dezembro de 2024 por Arsenal Católico

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