O Casamento Antes de Cristo – Monsenhor Tihamer Tóth

Adão e Eva - O Casamento antes de Cristo
Detalhe: Adão e Eva por Alberto Dürer, pintura 1504, Galeria de Arte de Ontário, Domínio Público, Wikimedia.

CONFERÊNCIA II

O CASAMENTO ANTES DE CRISTO

Quando o apóstolo S. Paulo, em sua epístola aos Efésios, fala do casamento, emprega esta expressão profundamente significativa: “É um grande mistério”. “Magnum mysterium” ( Ef 5, 32).

Nós que queremos, através de nova série de instruções, esboçar o quadro ideal da família cristã, devemos antes penetrar no fundo “deste grande mistério” evocado por S. Paulo, e procurar sua essência. Qual a essência do matrimônio? Qual o pensamento profundo que o Criador quis realizar, instituindo o matrimô­nio? ele de fato o instituiu? Não foi estabelecido pela vontade humana, ou o desenvolvimento da civilização trouxe-o consigo? Qual o ideal do matrimônio segundo o pensamento divino? Tais as questões de que trataremos.

Responderemos em duas instruções especiais, porque na história do matrimônio há um acontecimento que lhe trouxe uma transformação essencial: sua regulamentação por Nosso Senhor Jesus Cristo. Já antes de Cristo o casamento era um “grande mistério”, uma coisa nobre e venerável, como o é hoje para aqueles que não conhecem Cristo; este é o assunto desta instrução. Em outra, o veremos “um grande mistério”, elevado à dignidade de sacramento.

Estudemos hoje o ideal do matrimônio antes de Cristo. Vemos que ele era já “um grande mistério”, porque desde o princípio foi Deus quem o fundou. Mas se ele o criou, então o próprio matrimônio dos não cristãos é santo, intangível e indissolúvel.

I) FOI DEUS QUEM INSTITUIU O MATRIMÔNIO

Desde sua origem, o matrimônio foi realmente instituído por Deus. Isto afirma claramente o Antigo Testamento. O jovem Tobias, orando a Deus antes de seu casamento, diz muito naturalmente: “Senhor Deus, meu Pai . . . criaste Adão do limo da terra e lhe deste Eva por companheira” (Tob 8, 7, 8 ). O livro dos Provérbios chama o casamento “uma aliança divina”. Também no livro do Êxodo, o sexto mandamento divino protege o casamento contra a profanação ( Ê.x 20, 14) . Eis por que se termina o casamento com essa linda bênção : “Que o Deus de Abraão, o Deus de Isaac, o Deus de Jacob, esteja convosco, que Ele mesmo vos una, e espalhe sobre vós a plenitude de suas bênçãos (Tob 7, 15).

Se procurarmos, porém, como se formou a concepção da origem divina do casamento, é preciso remontar às primeiras páginas do primeiro livro da Sagrada Escritura. O primeiro e o segundo capítulo do Gênese proclamam claramente e com uma firmeza indiscutível ser o casamento, na realidade, uma instituição divina, e não uma invenção humana.

A) A primeira prova da origem divina do casamento encontra-se, pois, no primeiro capítulo do primeiro livro da Bíblia, onde vemos a descrição da criação do homem e da mulher.

a) Quando se examinam os homens, notam-se entre eles grandes e múltiplas diferenças: um é grande, e outro pequeno; um é louro, e outro moreno, um é gordo e outro magro; um é forte, e outro é fraco, e assim por diante. Há, porém, uma particularidade que é essencialmente mais importante que todas as outras: “há homens e há mulheres“.

Coisa curiosa, há uma força misteriosa e regular que mantém esta diferença num equilíbrio tal que nascem, mais ou menos, sempre tantos rapazes e tantas moças; mais exatamente, há um pouco mais de rapazes, porém a cifra da mortalidade sendo mais elevada entre estes, a diferença diminui novamente.

Donde vem, pois, esta particularidade tão importante da humanidade?

Donde vem a origem do homem e da mulher?

As primeiras páginas da Santa Escritura esclarecem-nos sobre esta questão. Foi Deus quem criou separadamente o homem e a mulher, mas uniu-os, ao mesmo tempo, numa união santa, e, confiou-lhes uma tarefa magnífica. Escutai as próprias palavras da Escritura: ” Deus criou o homem à sua imagem: criou-o à imagem de Deus; criou-os homem e mulher. E Deus abençoou-os, e disse-lhes: “Sêde fecundos, multiplicaivos, e enchei a terra” (Gn 1 , 27-28).

b) Estas palavras da Escritura, porém, respondem ao mesmo tempo àqueles que perguntam, algumas vezes, admirados: “Como é possível que seja permitido no casamento alguma coisa que fora do casamento constitui um pecado grave? Não é uma contradição: ali é permitido, aqui não é? A coisa não é a mesma em ambos os casos?

A resposta, porém, é clara, segundo os livros Santos. Fora do casamento é um pecado grave, porque Deus confiou ao matrimônio a união indissolúvel de um homem e de uma mulher, a conservação da raça humana, e pois, só no casamento é permitido o ato pelo qual nasce uma nova vida humana. Este ato, fora do casamento, é justamente um pecado grave porque fere o direito privilegiado do matrimônio, e arruína assim a família. Ora, isto é que se precisa evitar, a todo o custo.

B) O que temos no primeiro capítulo da Sagrada Escritura não é uma elucubração artificial, mas realmente a vontade de Deus. Isto é a conseqüência clara do segundo capítulo, pois aí encontramos a narração minuciosa da instituição do matrimônio (Gn 2, 15-24).

a) O primeiro homem, embriagado pelas energias imensas de sua nova vida, passeia entre os esplendores da natureza em flor, sua alma freme quase à vista das maravilhas do paraíso terrestre, mas, a si mesmo, parece que falta alguma coisa: não há alguém a quem comunicar sua alegria, alguém para entender suas palavras, não há quem lhe seja semelhante na terra. E então – para que tenha um auxílio, um apoio, uma companheira na vida – Deus criou a primeira mulher.

b) Mas o que Adão sentia, no instante em que a consciência de suas jovens forças dominava seu corpo robusto, este desejo de um complemento, de uma compreensão, de uma comunicação de alma, de um aperfeiçoamento, sente igualmente todo descendente dos dois sexos da humanidade. Na plenitude de seu desenvolvimento orgânico, o homem e a mulher sentem que lhes falta alguma coisa, que se encontra no outro sexo. Necessitam de um complemento que se encontra nas qualidades diferentes de outro sexo, pois só então é que se realiza o ideal completo do homem.

É nesta união, nesta mescla, neste complemento mútuo dos dois gêneros da natureza humana, que se realiza aquela unidade dos esposos, cujo exemplo não se encontra no mundo, e do qual a Sagrada Escritura observa: “O homem deixará seu pai e sua mãe, unir-se-á à sua esposa, e tornar-se-ão uma só carne” (Gn 2, 24) .

O homem faz alguma coisa de análogo, quando reúne metais cujas propriedades diferentes se completam mutuamente, e esta nova mistura, assim obtida, é mais forte e resistente.

c) Se assim é, se realmente é natural, desejável e conveniente que dois gêneros de seres humanos vivam sobre a terra, como características inteiramente diversas, mas atraindo-se reciprocamente, se isto é natural, então podeis julgar, vós mesmos, meus irmãos, quanto é prejudicial e contrário à natureza o moderno costume que educa as jovens como se fossem rapazes, querendo transformá-las em tais, enquanto quer fazer dos rapazes moças: forma rapazes-moças, moças-rapazes, e que suprimindo a diferença entre os dois sexos, arrebata-lhes justamente aquela força misteriosa de atração, que tem por objeto formar, na vida social, a célula mais importante, a fonte de uma renovação incessante da raça humana, e a garantia de sua propagação: uma nova família.

II) QUE É O MATRIMÔNIO SEGUNDO A VONTADE DIVINA?

Deus criou, pois, o matrimônio.

Mas por quê? Que idéia fazia t:.le da essência do matrimônio?

A) Perguntemos a nós mesmos: Que é o matrimônio conforme a vontade de Deus? É um contrato?

É. Mas é outra coisa ainda.

a) Por ocasião de seu casamento, os esposos passam realmente um contrato: prometem mútua fidelidade, assistência recíproca, auxílio na desgraça, fazem esta promessa sob uma forma solene. O casamento é, pois, também um contrato.

Quem não vê, porém, que é alguma coisa a mais? É a fusão misteriosa de duas almas, o encontro decisivo, e a união de duas vidas humanas. A humanidade já o pressentia mesmo antes do cristianismo, e eis por que vemos que entre os povos pagãos já o casamento era colocado entre as cerimônias religiosas, as mais solenes e variadas.

b) Tem-se o hábito de dizer que para o casamento há necessidade de dois: de um homem e de uma mulher. É um grande erro! Há necessidade de três: de um homem, de uma mulher e de mais um ainda – Deus. De fato Deus deve ter aí o primeiro lugar. Ele instituiu o casamento; é, pois somente com Deus e em Deus que se pode contratá-lo.

E não sendo o casamento um contrato puramente humano, e nem uma invenção humana, por isso mesmo a sua própria essência escapa à autoridade dos homens. O gênero de existência, de civilização, de forma política, em que ele vive, depende do homem. O casamento, porém, e a família não dependem do homem.

B) Que é, então, o casamento? pergunto novamente. Talvez um negócio particular entre duas pessoas?

É-o , efetivamente, e mais alguma coisa ainda: é de ordem pública também, e é um negócio de interesse geral.

O casamento não é, pois, uma colocação para as jovens, que não poderiam sair-se bem de outra maneira? Certamente não. É o casamento uma troca de amabilidades e de cumprimentos? Um instrumento de prazeres particulares? Realmente não. É um negócio de ordem pública, extremamente importante. E será mais fácil de se reconhecer, no labirinto inextrincável das questões matrimoniais, se se teve continuamente presente no espírito que o casamento não é só um negócio particular, mas também de interesse público; particular, enquanto sou livre de escolher, contrato matrimônio com quem quero. Mas uma vez realizado o casamento, então a sorte da humanidade inteira lhe está unida; tornou-o, pois, de ordem pública: não depende mais de mim rompê-lo.

C) Que é o matrimônio segundo a vontade divina? pergunto ainda pela terceira vez. “A união entre um homem e uma mulher até a morte, eis a resposta definitiva”.

O antigo e novo testamento mostram em numerosos exemplos como Deus olhava a santidade do amor recíproco de duas almas, e a alta estima em que tinha a vida comum dos esposos.

a) Lemos continuamente no Antigo Testamento que Deus qualifica de aliança matrimonial suas rel­ações com o povo eleito, e de infidelidade, a adoração dos ídolos por seu povo.

E, coisa curiosa: o Antigo Testamento encerra todo um livro, o “Cântico dos cânticos”, que simboliza, no sentido profundo, o amor de Deus pela alma humana, mas para quem o toma no sentido literal, nada mais é do que uma coleção de cânticos nupciais, celebrando o amor recíproco entre o esposo e a esposa.

b) Nosso Senhor, porém, fala do matrimônio em um sentido ainda mais elevado.

“O reino dos céus é semelhante a um rei que celebra núpcias de seu filho” (Mt 22, 2), lemos em uma parábola. Quando o filho de Deus quis imolar-se pela salvação da humanidade, escolheu, para símbolo de seu amor, por ser o mais generoso, o amor dos esposos.

O seu primeiro milagre Nosso Senhor fez, sabe-se muito bem, em umas núpcias, onde faltava o vinho, tirando, assim, de embaraço os jovens esposos.

E quando, um dia, os discípulos de S. João Batista lhe perguntaram por que os seus discípulos não jejuavam, enquanto que os de S. João e os fariseus jejuavam, Nosso Senhor respondeu-lhes: “Os amigos do esposo poderão entristecer-se, enquanto o esposo está com eles? Chegarão dias em que o esposo lhes será arrebatado, então eles hão de jejuar” (Mt 9, 1 5 ).

D) Mas para que nossas verificações acerca do matrimônio sejam mais completas, acrescentaremos ainda uma nova idéia. O matrimônio é não só uma coisa santa aos olhos de Deus, mas é, ao mesmo tempo, uma grande bênção e uma fonte de força indispensável para a sociedade.

a) A família é um organismo vivo e moral, onde cada um tem seus direitos e seus deveres fixados por Deus.

A família não é só a célula constitutiva da sociedade humana, como também o melhor apoio de ordem social, porque se baseia na ordem estabelecida e na autoridade. Ela encerra diferentes membros, com diferentes tarefas, trabalhando todos para um fim comum. Os filhos submetem-se aos pais, a mãe é a senhora do lar, o pai é o chefe da família.

b) Sim, meus irmãos, ainda hoje não hesitamos em afirmar abertamente que, segundo a vontade de Deus, o pai é o rei da família. Sua realeza, entre todas, é a mais antiga, porque sua fundação está nas primeiras páginas da Sagrada Escritura (Gn 3, 16). Esta realeza é independente de toda forma política: em república ou em monarquia, no sufrágio público ou secreto, sob uma ditadura ou sob um regime constitucional, a realeza do esposo permanece sempre intacta: a família será sempre a pequena monarquia onde o pai é a cabeça, o chefe.

c) Peço às minhas ouvintes não se entristecerem. Peço aos meus ouvintes não se ensoberbecerem por causa disto. Peço, sobretudo, aos meus ouvintes de um e outro sexo não discutirem, sem objeto, para saber quem vale mais, se é o homem ou a mulher. Lembrem-se do exemplo daquela mulher a quem seu esposo declarava, um dia, mui convencidamente: “Enfim o homem é o rei da criação!” A esposa responde, pondo-lhe mui docemente a mão sobre a cabeça: “É verdade; mas a mulher é a coroa desta cabeça”. Só assim é que se podem compreender mutuamente.

Certamente o homem não é uma mulher, nem a mulher um homem; os dois sexos nunca pois poderão ser iguais. Não significa, porém, isto que seus valores sejam desiguais. Mas se a natureza do homem e a da mulher são, muitas vezes, totalmente diferentes, daí resultam obrigações igualmente diversas, correspondendo aos dois sexos; mas estes deveres diferentes decorrem de direitos diferentes. Eis por que reconhecemos que a família é um pequeno estado, um pequeno organismo independente, um pequeno reino de Deus à parte, uma instituição onde há diferenças, subordinados e superiores, e uma repartição de trabalho. Faltando tudo isto, toda a família se desorganiza.

III) QUEM DEVE E QUEM NÃO DEVE CASAR-SE

Se, meus irmãos, a família, já antes de Cristo, aparece-nos envolta em uma luz sublime, se sabemos que o casamento é o fruto da própria vontade do Criador, daí, pois, a seguinte pergunta: Esta instituição divina é obrigatória para todos os homens, sem exceção? A vontade divina exige que todos os homens se casem? Podemos resumir a resposta em uma só palavra: Não. A própria continência total é mais preciosa aos olhos de Deus: Para a maior parte, porém, da humanidade a solução exata é somente o matrimônio.

A) O casamento não é obrigatório para todos os homens, e mesmo se alguém, por um fim mais elevado, para servir a Deus mais perfeitamente, escolhe o celibato, sua vida é mais preciosa diante de Deus que o casamento, eis o que conhecemos, somente depois de Nosso Senhor Jesus Cristo.

a) Foi Ele que o proclamou claramente. Um dia, com efeito, o Salvador declarou que havia homens, que não se casavam “por causa do reino dos céus” (Mt 19, 12), isto é, a fim de viver inteiramente para Deus.

S. Paulo declara em seguida, mais minuciosamente: “Quem não se casou cuida das coisas do Senhor e procura agradar o Senhor; quem se casou cuida das coisas do mundo e procura agradar sua mulher e está dividido” (1 Cor 7, 32-33).

O casamento está, pois, no plano divino, mas a castidade é um estado ainda mais perfeito. É assim que devemos compreender aquele pensamento de S. Paulo quando escreve : “É bom para o homem não tocar a mulher” (1 Cor 7, I), isto é, que a virgindade perfeita, escolhida para servir a Deus, e por amor ao próximo é uma evolução espiritual maior.

Aquele que permanece celibatário para servir a Deus com um coração sem partilha oferece-lhe, pois, um grande sacrifício.

b) Deus, porém, a isto não obriga ninguém. É apenas um “conselho evangélico”, e não um preceito. “Aquele que pode compreender, compreenda” (Mt 1 9, 12), diz o próprio Nosso Senhor.

S. Paulo também proclama que a maior parte da humanidade não é chamada a isto, quando ele escreve na mesma passagem que para evitar o pecado da impureza “cada um tenha sua mulher e cada mulher tenha seu marido” (1 Cor 7, 2). A palavra “tenha” possui aqui um sentido restrito, e quer dizer “é permitido que tenha”. Para a maior parte da humanidade é, pois, regra geral, porque o dom da continência, durante toda a vida, não é atribuída senão a um pequeno número.

E agora podemos responder a pergunta: Quem deve casar-se, e quem não deve?

B) Quem não deve casar-se?

a) Todo aquele, primeiramente, cujo organismo luta contra sombria hereditariedade ou sofre de uma moléstia congênita, fará bem em não se casar, porque pais que sofrem de uma grave moléstia hereditária não podem quase dar a vida, senão a filhos do mesmo modo, gravemente doentes.

É porém interessante notar que alguns desejariam ver as leis civis mais rigorosas, neste ponto, que as leis eclesiásticas, e quereriam proibir oficialmente o casamento destes doentes. A moral cristã ao contrário, embora não aprove estes casamentos, não os proíbe como falta grave, – assim o proclamou, claramente, Pio XI na encíclica Casti connubii.

Por que não os proíbe? Porque se pode fazer com que, para estes infelizes, o casamento signifique consolo, alívio e reconforto, ajudando-os, assim, a realizarem o fim eterno de suas almas. O fim da Igreja é facilitar, ao homem, a salvação de sua alma.

b) Quem mais não deve casar-se?

Aquele que quer pôr a sua vida ao serviço de um grande ideal, como por exemplo, às pesquisas científicas ou ao serviço do próximo, mas, em primeiro lugar, ao serviço de Deus. Não devem estes casar-se, mas guardar, até à morte, continência perfeita, castidade absoluta.

c) E quem mais não deve casar-se? Aquele que é doente, aquele que deseja ser sacerdote ou religiosa. E depois? Ninguém mais.

Fora destes casos à maior parte da humanidade aplicam-se realmente como um preceito estas palavras do Criador: “Crescite et multiplicamini”, crescei e multiplicai-vos (Gn 1, 28). Quem não é doente ou não quer colocar-se ao serviço de um grande ideal deve casar-se.

Deve casar-se, porque é a vontade de Deus, que dele o exige, e porque o exige, também, seu próprio interesse bem compreendido.

“É bom que o homem não esteja só” (Gn 2, 28), lemos nas páginas da Sagrada Escritura. E como são certas estas palavras! Foram ditas por Deus que criou o homem, e conseqüentemente conhece melhor a natureza humana.

A literatura tem muitas vezes descrito a vida solitária do celibatário, do velho solteiro, que certamente não é digna de inveja. Mesmo altamente colocado, sua alma, porém, está vazia. Tem uma bela vivenda, mas não possui um lar. A noite de Natal chega, e em lugar de risos argentinos dos filhos ouve apenas o tique-taque monótono do relógio, no quarto vazio e deserto: sim, envelheceis, envelheceis, e os anos fogem.

E é aqui que eu quero mostrar a grande diferença que existe entre o celibatário e a jovem que não se casou. De fato, se um homem fica velho solteiro, as mais das vezes é por sua própria culpa: ele não quis casar-se. A jovem, porém, se permanece solteira, não é, as mais das vezes, por sua culpa: ela não pôde casar-se. A voz da consciência não fala pois, do mesmo modo, em ambos os casos. A jovem que, sem culpa, não se casou pode, nos momentos de abandono, encontrar consolo na resignação à vontade de Deus, que assim dispôs, mas, ao contrário, ela faz falta ao homem que não pode atribuir senão a si próprio, e ao seu egoísmo, o sentimento angustioso da solidão que um dia pesará sobre ele.

E agora direi aos meus ouvintes, – sem medo de magoá-los, pois chamei-os “reis” – dir-lhes-ei claramente o que penso nesta grande questão: Senhores, ou padres ou casados, não há solução diferente.

* * *

As nossas afirmações, sobre o matrimônio, exaradas nesta instrução, revestem-no do brilho da vontade divina, ainda que tenhamos apenas estudado a metade da questão. Até agora não o vimos senão como a lei escrita na natureza humana, como o matrimônio natural, como era antes de Nosso Senhor Jesus Cristo. É já um grande e sublime ideal, é o sustentáculo e o fundamento da sociedade humana.

Em nossos dias, graças a Deus, a legislação civil já compreende a importância da família para o Estado, e é com júbilo que observamos suas primeiras manifestações em defesa da família atacada e em perigo. Seria, porém, desejável que a legislação civil fizesse todo o esforço para assegurar a pureza e a força da família.

De fato, quantas ocasiões se oferecem, ao Código Civil, para favorecer a família, tanto pelas medidas de previdência social, como pela proteção mais enérgica à moral pública! Sem dúvida, só a educação da consciência cria a moralidade, pois esta não vem das leis, mas o Estado deve também auxiliá-la, protegendo esta consciência. É realmente alarmante a impunidade com que nos teatros, nos cinemas, nos livros e revistas, cheias de ilustrações imorais, zomba-se das idéias de família, e abala-se a moralidade. De que servem os sermões? Para que a ordem de “salvar a família? Para que tantas investigações e congressos sobre a salvação da família, se a onda das edições pornográficas escritas, “só para adultos de mais de 16 anos”, inundam as nossas ruas?

Não esqueçamos, o casamento, como ensina a Igreja Católica de acordo com o mandamento de Deus, não é uma invenção arbitrária, mas sim uma instituição baseada na natureza humana. Há necessidade absoluta de observarmos as leis de Deus, pois ao contrário a vida humana tornar-se-á um caos profundo e incompreensível, uma multidão em ruínas; assim como a existência da natureza toda tornar-se-á desordem e caos, se alguém suspender as leis da química e da fí­sica, pretextando que elas são “arcaicas” e que é preciso caminhar com a época. O mesmo Deus, portanto, que gravou na natureza inanimada as leis físicas e químicas, é o mesmo que impôs os mandamentos, e portanto, o matrimônio, ao homem.

Os céus façam com que a humanidade compreenda isto, antes que seja tarde demais!

Possa ela compreendê-lo, voltando ao ideal de pureza do matrimônio instituído por Deus. Amen.

Casamento e Família, Monsenhor Tihamer Tóth, Sermões e Conferências, 1959.

Última atualização do artigo em 20 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico

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