Santa Francisca Romana nasceu em 1384. Seu nascimento coincidiu com uma época tristíssima que a Igreja atravessou. Foi o tempo da grande cisma, que tanta confusão causou no rebanho de Cristo. No meio das tempestades que ameaçavam meter a fundo a barca de S. Pedro, Deus velou sobre sua obra e deu à Igreja o consolo de sua assistência, de que uma prova é a aparição de grandes Santos naqueles séculos turbulentos. Uma delas é Santa Francisca Romana, filha de Paulo Brussa e de Jacobella da Roffredeschi, ambos descendentes da aristocracia romana. A seu desejo ardente de pôr a vida no serviço de Deus e se filiar em uma Ordem religiosa, os pais não se mostraram favoráveis. Usando o direito paternal, garantido pelo costume antiquíssimo das famílias patrícias de Roma, Paulo Brussa, deu sua filha em matrimônio ao jovem e nobre Lorenzo Ponziani, cuja família se orgulhava de ter entre os seus ascendentes o Papa mártir Ponciano. Logo após o casamento, Francisca adoeceu gravemente e sua cura foi por ela atribuída a Santo Aleixo, que se dignou de lhe aparecer durante os dias da doença. Desde o seu restabelecimento Francisca dedicou-se largamente às obras de caridade nas casas dos pobres e doentes, nos hospitais ou onde queria que sua presença fosse reclamada. Sua caridade parecia não ter limites.
Deus abençoou seu lar dando lhe três filhos: João Baptista, João Evangelista e Ignez. Com o ano de 1378 vieram sobre a cidade de Roma dias de horror. A Igreja não tinha só um, mas três Papas ao mesmo tempo e cada um deles se empenhava em ganhar as simpatias de Nápoles. Urbano VI, o Papa legitimamente eleito, reconheceu em Carlos de Durazzo da casa de Aragão o herdeiro da rainha Joanna II de Nápoles, quando esta, não tendo filhos, legou os seus direitos a Louis de Anjou. Estavam pois em continua rivalidade as casas de Anjou e Aragão, cujos representantes respectivos no tempo de Francisca eram: Ladislau e Louis II. Devido a este estado das coisas, Roma tornou-se teatro e joguete dos partidos, conforme os respectivos Papas davam apoio a este ou aquele partido. A família dos Ponciani colocou-se ao lado do Papa legítimo. O filho de Carlos de Durazzo, Ladisláu de Nápoles, tornou-se o terror de Roma. Num dos seus assaltos à cidade, o marido de Francisca foi gravemente ferido. Seu cunhado Paluzzo caiu no poder do inimigo e foi como por um milagre que o filho mais velho João Baptista não teve a mesma sorte. Numa segunda invasão Ladisláu obrigou a muitos cidadãos e também a Lourenço a abandonar a cidade.
Três anos depois apareceu novamente o invasor e desta vez devastou a cidade duma maneira bárbara. O palácio de Francisca foi invadido e roubado; a criadagem sofreu os maiores vexames e João Baptista foi feito prisioneiro. Para completar a desgraça, apareceram os flagelos da fome e da peste, da qual foram vítimas João Evangelista e Ignez. Com a morte do tirano em 1414 veio tempos mais sossegados e voltaram os prisioneiros e fugitivos. O Papa Martinho V fez sua entrada em Roma sobre cadáveres e escombros. Dois anos depois morreu o marido de Francisca. Em todas estas provações, no meio de tantas tribulações teve Francisca ocasião de praticar as virtudes da paciência e conformidade com a vontade de Deus. Quando a miséria chegou ao auge foi Francisca o anjo da caridade para os pobres e necessitados. Aos inimigos perdoou de coração e obteve de Lourenço que também ele estendesse a mão aos seus desafetos. Mergulhada num mar de desgostos, não faltaram a Francisca as consolações, sem as quais ninguém vive, e que costumam descer copiosamente, à medida que dispensamos o consolo do mundo. Longe de, à maneira de mãos e tíbios cristãos, entregar-se ao desespero e desânimo, Francisca procurou e achou conforto na oração, na recepção da santa Comunhão e na prática da caridade. Além disto Deus a consolou com revelações e comunicações místicas sobre a vida de Nosso Senhor Jesus Cristo e Maria Santíssima. Houve tempos em que teve a honra de trazer no corpo as impressões das chagas de Nosso Senhor e sentir as dores de sua santa Mãe. Característico na vida de Santa Francisca é convivência constante que teve com seu anjo da guarda. Bem jovem ainda, nos primeiros anos de casada sentia a presença de seu anjo que a castigava sensivelmente quando cometia pequenas faltas. Quando perdeu seu filhinho Evangelista, este lhe apareceu com grande glória, comunicando-lhe sua felicidade na visão de Deus. Disse-lhe também, que trouxera do céu um anjo, que a acompanharia, que seria seu protetor e guia em todas as ocorrências da vida. Este anjo acompanhou a Francisca durante 24 anos, tornando-se visível só quando falava com seu confessor e quando o inimigo a molestava com fortes tentações. Cometendo ela uma inadvertência no serviço de Deus, o anjo não a castigava, mas velava o rosto.
Mais íntima foi sua convivência com o anjo que Deus lhe dera no último período da vida, depois da sua entrada na Ordem por ela fundada. Este anjo lhe era visível e no seu olhar ela lia a resposta a cada pergunta e o aviso das coisas futuras.
Desde a sua infância era a vida monástica o sonho de ouro de Francisca, sonho que se realizou só no fim da sua vida. Durante as grandes lutas em Roma, a virtude e o heroico exemplo de Francisca fizeram com que muitas senhoras da melhor sociedade a ela se ligassem com o fim de se animarem na prática da piedade e virtude cristã. Já no ano de 1425 formou-se uma organização de senhoras que se agregaram ao ramo da Ordem Beneditina das Olivetanas de Santa Maria Nuova. Em 1431 a mesma associação recebeu a primeira regra e tomou posse duma residência perto da Igreja Santa Maria in Campitelli. A comunidade se compunha de dez senhoras e o pequeno convento tinha o nome de Tor de’ Spechi. Enquanto seu marido era vivo, Francisca não tomou parte na vida da comunidade. Sendo viúva, nada mais a pode reter. Em 1433 a nova Associação recebeu a aprovação do Papa Eugenio IV.
Mais uma vez voltou Francisca para a casa dos seus, para tratar do seu filho Baptista que enfermara gravemente. Baptista restabeleceu-se e a mãe morreu em 9 de Março de 1440. Seu corpo foi depositado na Igreja de Santa Maria Nuova.
REFLEXÕES
1. Criança ainda, Santa Francisca Romana não tolerava que alguém a visse insuficientemente coberta e menos ainda que lhe pusesse a mão irreverentemente.
– Quanto não pecam os pais, quando não têm o cuidado de vestir decentemente seus filhos pequenos, expondo-os a vistas curiosas, libidinosas e sensuais. A moda atual que prescreve vestido curto é injustificável perante a lei divina que manda respeitar a decência e o pudor também nas crianças pequenas. Que juízo será o daqueles pais que, deixando-se levar e guiar pelo espírito da vaidade e da sensualidade, extinguem na alma de seus filhos pequenos o sentimento do pudor, preparam a queda inevitável da inocência dos mesmos, não lhes cobrindo o corpo segundo as prescrições da decência cristã!
2. Francisca Romana criança ainda tinha seu prazer em rezar. A criança não sendo educada para a piedade, nunca se lembrará de fazer oração. Que conceito se deve fazer de pais, que não acham tempo para ensinar a seus filhinhos a rezar, mas os educam para todas as vaidades e futilidades, dando-lhes a liberdade que querem dentro de casa e na rua!
3. Francisca Romana tomando estado, seguiu o conselho de seus pais e foi feliz. Bons filhos não tratam casamento sem antes tomar o conselho e a benção dos pais. A benção dos pais é a benção de Deus. Só motivos extraordinários e muito graves podem dispensar desta obrigação de piedade filial. Grave pode ser o pecado dos pais, quando fazem imposição aos filhos em matéria de casamento: ou impelindo-os para que se casem contra sua inclinação com pessoa que não tem sua simpatia, ou proibindo-lhes a entrada numa Ordem religiosa se sua vocação for esta.
4. Francisca Romana viveu 40 anos na maior harmonia com seu marido. Que dizem a isso cônjuges que não passam nem 15 dias sem que haja entre eles sérias desavenças? Que dizem a isso cônjuges que, em vez de se amarem e respeitarem, se amaldiçoam e se guerreiam? Poderão eles ter a benção de Deus, que é o Deus de paz e de concórdia?
Na Luz Perpétua, Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus para todos dos dias do ano, apresentadas ao povo cristão por João Batista Lehmann, Sacerdote da Congregação do Verbo Divino, Volume I, 1928.