Santo Hilário, de quem Santo Agostinho, afirma ter sido excelente doutor da Igreja e defensor impertérrito da fé católica, nasceu em Poitiers. Seus pais eram abastados, porém pagãos. Nada deixaram faltar para que o filho recebesse boa educação e sólida instrução em todos os ramos da ciência. A leitura de vários livros levou-o ao caminho do conhecimento de Deus.
Satisfazendo ao desejo dos pais casou-se. O pouco que sabia do cristianismo, não mais o deixou em sossego. Com verdadeira sofreguidão leu os santos livros. Cada página que adiantava nesta leitura, mais o convenceu da cegueira do paganismo e da verdade da fé cristã. Por fim pediu o santo batismo. Com o dia da sua regeneração espiritual começou para Hilário uma nova vida. O Evangelho, sendo a única norma de seu proceder, levou-o a uma altura considerável da perfeição cristã, tanto que servia de exemplo e modelo aos seus irmãos em Cristo. O mistério da SS. Trindade, atrozmente atacado, e vilmente guerreado por alguns hereges achou em Hilário um dedicado e valoroso defensor.
Em 353 morreu o bispo de Poitiers. Clero e povo, em procura de um digno sucessor, uniram seus votos unânimes em Hilário. Por mais que este se recusasse de aceitar a alta dignidade, as insistências que vinham de todos os lados afinal fizeram com que reconhecesse na voz do povo a voz de Deus. De fato não foram iludidas as esperanças dos seus diocesanos. Em Hilário teve o episcopado um representante de alto valor, a igreja católica um firme defensor, a diocese de Poitiers um modelo de pastor. Seu primeiro cuidado foi conservar aos seus diocesanos a fé pura, exposta ao terrível contágio da heresia de Ario. Com grande desgosto e séria apreensão notou o Bispo que esta peste do erro sob a égide do imperador Constâncio ia tomar proporções cada vez mais assustadoras não só no Oriente, como também no Ocidente. Saturnino, bispo ímpio e sem consciência, sem dificuldade fez a vergonhosa transação. Por ele convocado realizou-se em Arles, sua metrópole, um sínodo de bispos arianos. Hilário não só protestou contra esta manifestação: mandou aos bispos munidos em conselho um memorando muito bem elaborado, em que com argumentos irrefutáveis reduziu a nada o Arianismo. Nenhuma resposta deram os hereges, mas Saturnino alcançou do governo imperial a expulsão de Hilário.
Quatro anos durou o exilio, que o santo bispo passou na Frígia (356). Devido à assistência enérgica do clero de Poitiers, a heresia não logrou tomar pé naquela diocese. Hilário aproveitou o tempo de seu desterro para escrever livros. O mais importante é sua obra sobre a SS. Trindade em 8 partes, que constituem a refutação completa do Arianismo. Num concílio que se realizou em Selêucia, Hilário tomou parte ativa. De Selêucia dirigiu-se a Constantinopla, onde se apresentou ao imperador, insistindo com ele no que abandonasse a heresia e desse à nação o exemplo de conversão. Convidou a Ursacio e Valente, dois bispos arianos cuja influência sobre o imperador tudo valia, para uma conferência pública. Estes, porém, temendo a dialética e grande erudição do adversário, não aceitaram, mas determinaram o imperador, para que o deixasse regressar à sua diocese.
Grande foi o júbilo dos seus diocesanos, vendo seu querido Pastor outra vez em seu meio. A viagem de Santo Hilário pela França parecia uma marcha triunfal, de tão grande que foi o entusiasmo com que era recebido e aclamado em toda a parte.
Restituído à sua diocese, Hilário começou a obra de sua pastoreação com novo zelo e nova energia. Um concílio na Gália, que se realizou à sua iniciativa, condenou a heresia e restabeleceu a antiga disciplina. Ao imperador expediu um memorando no qual com franqueza apostólica censura seu modo de favorecer a heresia e perseguir os católicos, e termina chamando a sua atenção a divina justiça que não falha. O ano 369 trouxe-lhe o descanso da luta e do trabalho. A vida agitada seguiu uma morte tranquila, que levou a alma do santo Bispo à eterna mansão da paz e da glória.
REFLEXÕES
A conversão de Santo Hilário foi o fruto da leitura dos livros bíblicos. A bíblia é o livro dos livros; de todos o mais precioso, mais venerável. Escrito por homens sob a inspiração do divino Espírito Santo, é a Bíblia a palavra de Deus. A Igreja católica dedicou e ainda dedica à Bíblia a mais carinhosa atenção, velando cuidadosamente sobre sua integridade. Tendo ela a assistência do Espírito Santo, esta circunstância por si já é a garantia mais segura, que a Igreja católica possui a Bíblia em sua autenticidade. A leitura da Bíblia, feita com reta intenção, pode ser de grande utilidade, e é desejo da Igreja, que seus filhos não desconheçam a Bíblia. É engano pensar que a leitura da Bíblia, é proibida. É uma das calúnias que o protestantismo levanta contra a Igreja católica, dizendo que a Igreja proíbe a leitura da Bíblia a seus fiéis. Os escritores sacros, os autores dos livros bíblicos escreveram-nos em sua língua, que era o hebraico ou o grego, línguas por bem poucas pessoas conhecidas. Aqueles que sabem aquelas línguas, podem, sem restrição alguma ler a Bíblia no texto original. Traduções que queiram fazer para o português ou qualquer outra língua viva, não devem ser publicadas, sem que a Igreja as tenha examinado cuidadosamente e verificado se a tradução está conforme ao original. Nada mais natural e razoável que isto. É esta uma exigência justíssima que a Igreja faz, para evitar que aos fiéis sejam entregues traduções malfeitas, truncadas, falsificadas. As traduções em língua vernácula devem trazer a aprovação da autoridade eclesiástica e notas explicativas de pontos de difícil compreensão. Estas notas devem ser tiradas dos Santos Padres ou de autores reconhecidamente competentes. São absolutamente proibidas as traduções que não se acham de acordo com estas determinações da Igreja. Proibidas são as Bíblias dos metodistas ou das Sociedades bíblicas, pelos motivos já explicados. O leitor da Bíblia não se deve esquecer, que a Bíblia é um livro misterioso, cuja explicação não é coisa fácil. É um livro que traz muitas coisas de difícil compreensão, coisas, que são adulteradas por indoutos, e inconstantes, para ruína de si mesmo. (lI Pet. 3. 16.) Todas as heresias tiveram e têm sua origem na má explicação da Bíblia. Tolice não há, que não encontre na Bíblia mal explicada seu argumento. O próprio demônio tentando a N. Sr. argumentou com textos bíblicos.
Na Luz Perpétua, Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus para todos dos dias do ano, apresentadas ao povo cristão por João Batista Lehmann, Sacerdote da Congregação do Verbo Divino, Volume I, 1928.
Última atualização do artigo em 27 de março de 2025 por Arsenal Católico