De joelhos em oração [detalhe], por Ernst Hildebrand, 1885, Domínio Público / Wikimedia Commons

Senhor, fazei que eu tema uma só coisa: desagradar-Vos e separar-me de Vós.

1 – O Espírito Santo convida-nos para a Sua escola: “Vinde, filhos, ouvi-me, eu vos ensinarei o temor do Senhor” (Sal. 33, 12). É esta a primeira lição que o divino Paráclito dá à alma desejosa de santidade, lição importantíssima e fundamental porque, infundindo na alma o ódio ao pecado, que é o maior obstáculo à união com Deus, assegura o desenvolvimento da vida espiritual. Precisamente neste sentido, a Sagrada Escritura diz: “O temor de Deus é o princípio da sabedoria” (Ecli. 1, 16).

Para me educar no temor de Deus, o Espírito Santo, em vez de nos pôr diante dos olhos a visão dos castigos e das penas devidas ao pecado, e de nos apresentar Deus como um juiz severo, mostra-no-lO como um Pai amantíssimo, infinitamente desejoso do nosso bem e apresenta-nos o quadro comovedor dos Seus benefícios e misericórdias. “Deus amou-te com amor eterno, por isso te atraiu a si… – sussurra Ele no fundo da nossa alma – Não és escravo, mas amigo e filho” (cfr. Jer. 31, 3; Jo. 15, 15). Presa de amor para com um Pai tão bom, a alma não deseja outra coisa senão corresponder ao Seu amor, dar-Lhe gosto e viver sempre unida a Ele; por conseguinte, além do pecado que constrita a Deus e que tem o triste poder de a separar dEle, já nada teme. Que diferença entre este temor filial, fruto do amor, e o temor servil, fruto do medo ao castigo! É verdade que também o temor do juízo e dos castigos divinos é salutar e, em certos casos, pode até servir de muito para afastar a alma do pecado; mas se não se vai transformando pouco a pouco em temor filial, nunca será suficiente para impelir a alma para a santidade. O temor puramente servil gela a alma e amesquinha-a, ao passo que o temor filial dilata-a, lança-a no caminho da generosidade e da perfeição.

2 – O dom de temor aperfeiçoa simultaneamente as virtudes da esperança e da temperança. O objeto da esperança é a posse de Deus e a bem-aventurança eterna; o dom do temor, fazendo-nos evitar, com todo o cuidado, a mais pequena ofensa a Deus, põe-nos nas melhores condições de esperarmos a união beatífica do céu e de obtermos os meios necessários para a alcançar.

O objeto da temperança é refrear as paixões e a atração para o prazer sensível; o dom de temor aperfeiçoa esta virtude, tornando-nos mais generosos em mortificar os nossos sentidos e as nossas paixões. Impelidos por este santo temor, estaremos mais vigilantes do que nunca a fim de não nos deixarmos arrastar pelo desejo das satisfações e estaremos prontos a renunciar a tudo para não darmos ao Pai celeste o mais pequeno desgosto. “Vale mais desagradar-me a mim do que desagradar a Deus”, repete a alma sob o influxo deste dom.

Assim, mais do que fazer-nos temer a Deus, o Espírito Santo faz-nos antes temer-nos a nós mesmos, a nossa má vontade e as nossas paixões que, sendo causa do pecado, podem pôr-nos em perigo de ofender a Deus, de nos separarmos dEle ou, pelo menos, de não vivermos bastante unidos a Ele. Não se trata porém, de um temor que gera inquietações e escrúpulos, mas de um temor unido ao amor, à confiança, e que por isso leva a alma a pôr-se totalmente nas mãos de Deus, a fim de que Ele a preserve de qualquer sombra do pecado. Embora lançando-a com imensa confiança nos braços do Pai celestial, o dom de temor infunde-lhe também um sentimento de respeitosa reverência pra coma Sua majestade infinita: a alma sente que Deus, em virtude da Sua suprema dignidade, lhe está sumamente distante, mas sente também que, devido ao Seu amor misericordioso, Se aproximou tanto dela que a convidou a viver na Sua intimidade. Entre estas alternativas de reverência filial e de total confiança, o dom de temor chega à maturidade e desabrocha no amor perfeito. “Quando a alma chega a ter com perfeição o espírito de temor, possui já em perfeição o espírito de amor, porquanto aquele temor, que é o último dos sete dons, é filial, e o temor perfeito de filho sai do amor perfeito de pai” (J.C. C. 26, 3).

Colóquio – “Meu Deus, ainda que eu Vos deseje amar, ainda que eu conheça as vaidades do mundo e a estas prefira o Vosso serviço, enquanto viver neste mundo não posso estar seguro de não tornar mais a ofender-Vos. Sendo assim, que deverei fazer senão recorrer a Vós e suplicar-Vos que os meus inimigos me não façam cair em tentação? Como poderei descobrir os seus embustes? Oh! meu Deus, como tenho necessidade do Vosso auxílio! Dizei-me, Senhor, alguma palavra que me traga a luz e a segurança! Dignai-Vos dar-me algum remédio para me pôr ao abrigo dos assaltos desta guerra tão perigosa! Vós dizeis-me que esse remédio é o amor e o temor. O amor deve fazer-me apressar o passo e o temor far-me-á ver onde ponho os pés para não cair. Dai-mos ambos, Senhor, visto que o amor e o temor são dois castelos fortíssimos do alto dos quais poderei vencer todas as tentações. Sustentai-me Vós, Deus meu, de tal forma que nem por todo o ouro do mundo cometa advertidamente nenhum pecado venial, por pequeno que seja” (cfr. T.J. Cam. 39, 4 e 6; 40, 1 e 2; 41, 1).

“Meu Senhor e meu Deus, todo o meu bem é permanecer unido a Vós e pôr em Vós toda a minha esperança. Abandonada a si própria, a minha alma seria como um sopro que se dissipa e não volta. Sem Vós não posso fazer o bem nem estar firme nele, sem Vós não posso amar-Vos nem agradar-Vos nem evitar o que Vos desgosta. Refugio-me, pois, em Vós, a Vós me abandono para que me sustenteis com o Vosso poder, me retenhais com o Vosso vigor e não permitais que jamais me separe de Vós” (cfr. S. Bernardo).

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

Última atualização do artigo em 25 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico

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