As virtudes e os dons

Ensinai-me, ó Espírito Santo, a manter-me sempre atenta às Vossas inspirações e em contínua dependência dos Vossos impulsos.

1 – S. Tomás ensina que os dons do Espírito Santo nos são dados como auxílio das virtudes: “dona sunt in adjutorium virtutum“. A expressão é muito profunda: os dons são-nos dados para ajudar as virtudes, portanto não para as substituir; isto quer dizer que a alma deve fazer da sua parte tudo o que puder, aplicando-se seriamente ao exercício das virtudes, e então o Espírito Santo, mediante os dons, completará aquilo que a alma não pode fazer. Por conseguinte, a primeira atitude prática que a alma deve tomar, a fim de que o Espírito Santo Se digne pôr em ato os Seus dons, é pôr-se pelos seus esforços, a caminho da santidade. Toda a tradição católica põe como ponto de partida esta atividade e aplicação pessoal, porque “se a alma busca a Deus, muito mais a busca o seu amado… e fá-la correr para Ele” (J.C. CV. 3, 28). E a alma procura a Deus através do exercício assíduo das virtudes que embora não seja suficiente para a conduzir à meta, é porém necessário para demonstrar ao Senhor a sua boa vontade. Como o marinheiro que deseja chegar ao porto não espera ociosamente o sopro do vento, mas enquanto espera, põe-se a remar com vigor, assim a alma que deseja encontrar o Senhor, enquanto espera que Ele a atraia a Si, não se abandona ao ócio, mas aplica-se com vigor a procurá-lO com as suas iniciativas pessoais: são esforços para vencer os próprios defeitos, para se desprender das criaturas, para praticar as virtudes, para se aplicar ao recolhimento interior, etc. E nestes esforços o Espírito Santo inserirá a Sua ação pondo em ato os Seus dons. Vemos assim como é errada a atitude de certas almas que permanecem demasiado passivas na sua vida espiritual, não tomando suficientes iniciativas pessoais para avançar no bem, para ir ao encontro de Deus. Estas almas perdem o seu tempo e expõem-se a fáceis ilusões. Sobretudo no começo da vida espiritual é necessário pôr-se ativamente à obra, pois só assim podemos contar com o socorro do Espírito Santo.

2 – Em geral, no primeiro período da vida espiritual, o influxo dos dons do Espírito Santo, embora nunca falte, é oculto e raro. Por isso, é natural que neste período prevaleça sobretudo a iniciativa da alma, isto é, o exercício ativo das virtudes e da oração. Mas, à medida que a vida espiritual se desenvolve, ou seja, à medida que a caridade cresce, aumenta também a influência dos dons; mais ainda, quando a alma é fiel, esta influência torna-se gradualmente mais forte e mais frequente, até prevalecer sobre as suas próprias iniciativas; e é assim que, sob a direção do Espírito Santo, a alma atinge a santidade.

Para poder aproveitar estes dons do Espírito Santo, requer-se que a alma, desde o início da sua vida espiritual, se habitue a ser, ao mesmo tempo, ativa e passiva, isto é, que embora tomando as suas iniciativas, procure manter-se ao mesmo tempo atenta e dócil às inspirações do Espírito Santo. De fato, há almas demasiado passivas, e também as há demasiado ativas as quais fazem consistir tudo nos seus planos de reforma espiritual, nos seus propósitos, nos seus exercícios, como se a santidade dependesse unicamente da sua habilidade. No fundo contam demasiado com as suas forças e pouco com o auxílio divino. Estas almas correm o risco de não saberem captar as inspirações do Espírito Santo, de sufocarem os Seus impulsos e por isso, de se afadigarem sem conseguirem alcançar a meta. É necessário mais maleabilidade, docilidade, e abandono. Maleabilidade da mente para reconhecer as inspirações interiores do Espírito Santo, docilidade da vontade para as secundar, abandono para se deixar conduzir, mesmo por caminhos obscuros, desconhecidos e contrários aos próprios gostos. Ninguém pode ser o seu próprio mestre de santidade. Há um só mestre, o Espírito Santo; é preciso ir sempre à Sua escola, permanecer na Sua dependência, e por isso, embora trabalhando ativamente para a correção dos defeitos e para a aquisição das virtudes, é preciso manter o ouvido interior sempre atento aos impulsos do Espírito Santo; foi para nos tornar capazes disto que Ele nos deu os Seus dons. “O Senhor – diz Isaías – pela manhã chama aos meus ouvidos para que O ouça como a um mestre. O Senhor Deus abriu-me o ouvido e eu não O contradigo; não me retirei para trás” (50, 4 e 5). Esta deve ser a atitude interior duma alma que deseja deixar-se guiar pelo Espírito Santo.

Colóquio – “Ó Espírito Santo, Deus de amor, vínculo da Santíssima Trindade por via do amor, Vós repousais e pondes as Vossas delícias nos filhos dos homens, na santa castidade que , pelo influxo da Vossa força e dos Vossos encantos, floresce neste mundo como a rosa entre os espinhos. Ó Espírito Santo! Ó Amor! Dizei-me qual é o caminho que conduz a uma morada tão deliciosa, qual é a vereda da vida que me conduz a estas pradarias, fecundadas pelo orvalho divino, onde se dessedentam os corações abrasados pela sede. Ó Amor, só Vós conheceis este caminho que leva à vida e à verdade. Em Vós realiza-se o conúbio pleno de delícias que une entre Si as divinas Pessoas da Trindade Santa. Por meio de Vós, ó Espírito Santo, foram espalhados sobre nós os dons mais preciosos. De Vós procedem as sementes fecundas que produzem os frutos da vida. De Vós emana mel tão doce das delícias que só existem em Deus. Por Vós descem sobre nós as águas fertilizantes das bênçãos divinas, dons tão caros para o espírito, mas infelizmente tão raros nesta nossa região.

“Ó Espírito Santo, Vós sois a fome pela qual eu anseio, sois o desejo do meu coração. Oceano transbordante de águas, absorvei esta pequenina gota errante que deseja sair de si mesma para entrar em Vós. Só Vós sois a única e toda a substância do meu coração e a Vós me uno com todo o fervor. Oh! que amável união! Esta familiaridade conVosco é verdadeiramente mais aprazível que a própria vida; o Vosso perfume é como bálsamo de propiciação e de paz.

“Ó Espírito Santo Amor, Vós sois o beijo suavíssimo da Santíssima Trindade, que une o Pai e o Filho. Vós sois aquele bendito beijo que a real Divindade deu à humanidade por meio do Filho de Deus. Ó beijo dulcíssimo, que o Vosso vínculo não me abandone, átomo de pó; que os Vosso amplexos me apertem para que eu não seja senão uma só coisa com Deus. Fazei-me experimentar as delícias que há em Vós, ó Deus vivo. Meu dulcíssimo amor, fazei que eu Vos abrace, que me una a Vós! Ó Deus Amor, Vós sois a minha posse caríssima, além da qual nada mais espero, quero e desejo no céu e na terra” (Sta Gertrudes).

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

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