São Bernardo

São Bernardo tão celebre na Igreja pela santidade e ciência, como pelas obras grandiosas por ele efetuadas, nasceu em Fountain, na Bolonha. Filho de pais excelentes, tinha Bernardo seis irmãos e uma irmã. A mãe empenhou o maior cuidado na educação deste filho. Bem cedo teve a satisfação de descobrir em Bernardo um grande amor a Deus e à Santíssima Virgem, horror ao pecado, veneração pela pureza e inocência, desprezo ao mundo e zelo por tudo que se referia a Deus e sua santa causa. Certa vez, sofrendo dores de cabeça atrocíssimas, foi Bernardo procurado por uma mulher, que com benzeduras pretendia livrai-o daquele mal. Bernardo, que era menino ainda, ouvindo as propostas da feiticeira, pulou da cama, enxotou-a do quarto, e disse que preferia morrer de dor, a ser socorrido por praxes supersticiosas. Deus recompensou imediatamente este ato de fé viva, livrando o santo menino das dores, que o cruciavam. Bernardo teve a graça extraordinária de uma visão de Jesus Cristo, que lhe apareceu em forma de menino, como os pastores o encontraram em Bethlehem. Esta grande distinção extraordinariamente contribuiu para solidificar lhe cada vez mais o amor a Nosso Senhor.

Bernardo perdeu bem cedo a mãe. A bela estatura e formosura extraordinária fizeram com que, da parte de pessoas frívolas, lhe surgissem grandes lutas e perseguições, as quais, porém, resolutamente rebateu. Certa vez, estando Bernardo em viagem, recebeu agasalho na casa de uma mulher, cuja vida lhe era desconhecida. Alta noite a hospedeira entrou no quarto, onde o jovem peregrino dormia e solicitou-o a cometer um pecado vergonhoso. Bernardo, vendo o perigo, pôs-se a gritar altamente: “Socorro, ladrões, ladrões! ” Foi bastante para a tentadora se retirar imediatamente. Teve a mesma a ousadia de repetir três vezes a mesma tentação e todas as vezes encontrou a mesma resistência. Bernardo foi bastante delicado para não denunciar a filha de Satanás, embora o censurassem e o chamasse de maluco que, estando em casa alheia, desnecessariamente alarmava a todos. No dia da partida, outra vez interpelado pelo que acontecera, disse Bernardo: “De fato houve assalto, porque a própria dona da casa quis roubar-me o que tenho de mais precioso: – a minha inocência”. Para guardar este tesouro, o casto jovem empregava os meios mais eficazes, que são: a ora­ção, a mortificação dos sentidos, principalmente dos olhos e uma devoção terníssima à Santíssima Virgem. Para penitenciar uma falta, aliás pequena, que involuntariamente cometera, meteu-se em tempo de inverno num tanque, e ficou aturando a água gelada, até quase desfalecer. Esta penitência cruel teve por resultado ficar Bernardo, desde aquela hora, livre de qualquer sensibilidade quanto a tentações impuras. Tendo feito estas experiências, Bernardo outro desejo não mais nutria, senão retrair-se do mundo, no que encontrou forte resistência e contradição da família. Não só conseguiu desarmar-lhe as argumentações, mas seu exemplo foi imitado por um tio paterno e quatro irmãos, que, como ele, entraram, para a Ordem dos Cistercienses, fundação de S. Norberto. A caminho do convento, encontraram o irmão mais moço, Nivaldo, criança ainda, brincando na rua. Guido, o mais velho, disse ao menino: “Nivaldo, nós vamos para o convento e te deixamos toda a herança, sendo tu doravante senhor de todos os nossos bens”. Nivaldo, iluminado por Deus, respondeu: “Então, escolhendo para vós o céu, quereis que eu me satisfaça com a terra? Não! é uma divisão muito desigual e injusta que fizestes!”

Sem hesitar um momento, associou-se aos irmãos, e com eles tomou o hábito de S. Norberto. Em pouco tempo Bernardo se tornou modelo na prática das virtudes monásticas, tanto que o abade Estevão lhe confiou a direção do mosteiro, em Clairvaux. Embora Bernardo fizesse ver sua mocidade e inexperiência e além disto, o estado precário de saúde, a obediência exigiu-lhe o sacrifício de aceitar a cruz. Bernardo encontrou em Clairvaux um mosteiro, cuja riqueza era a extrema pobreza. Deus, porém, em muitas ocasiões, deu a prova cabal de que não abandona aqueles que põem toda confiança em sua bondade infinita. Fatos maravilho­sos, que se deram sob o governo de Bernardo, não deixavam a menor dúvida sobre a alta cotação, de que gozava o superior junto de Deus. Muitas pessoas, atraídas pela santidade de Bernardo, e, convencidas pela sua palavra ardente, abandonaram o mundo e procuraram, como ele, a solidão do mosteiro; assim Henrique, irmão do monarca reinante na França e a própria irmã.

O regime do novo Abade era rigorosíssimo; elucidado, porém, por uma luz superior, abandonou em seguida esse rigor, substituindo-o pela brandura. Contra si próprio usava de máxima severidade, enquanto que sua caridade e amabilidade para com o próximo eram irresistíveis. A vida particular de Bernardo era uma prática constante das mais ásperas e inclementes penitências. Surpreendendo-se uma ou outra vez em concessões à comodidade, aliás natural, dizia de si para si: “Bernardo, qual foi o fim para que viesse ao mundo?” Bernardo, ad quid venisti?

A fama de sua virtude e grande sabedoria passou além dos estreitos limites do mosteiro. Mais de uma vez recebeu convites honrosos para aceitar a mitra, que lhe era oferecida. Bernardo, achando-se indigno de tão alta patente, recusou-se constantemente a aceitar a dignidade episcopal. Na grande dissenção que houve, na eleição de dois Papas, a palavra de Bernardo foi decisiva. Havendo dois candidatos, Bernardo, depois de muito rezar, se pronunciou a favor de Inocêncio II, contra Pedro Leonis, que tinha adotado o nome de Anacleto II. Muitos outros negócios importantíssimos no regimento da Igreja foram apresentados ao alto critério de Bernardo, e por ele resolvidos.

A incumbência mais onerosa que lhe veio da suprema autoridade, foi de convidar os Príncipes cristãos para uma cruzada contra os turcos, que se tinham apoderado dos Santos Lugares. Bernardo, obedecendo à ordem recebida, pôs mãos à obra. Milagres extraordinários que lhe acompanhavam a espinhosa missão, pareciam não deixar dúvida alguma de que se tratasse de um empreendimento sumamente agradável a Deus.

O resultado, porém, foi terminar a cruzada por uma grande derrota dos cristãos. Longe de atribuir o fiasco à inépcia e a pecados cometidos pelos combatentes e chefes, a opinião pública acusou a Bernardo como o único responsável do desastre e foram as críticas, censuras, chalaças e insultos, que por este motivo sofreu, o maior martírio para o Santo. Bernardo, em vez de se defender e retribuir o mal com o mal, dizia: “Antes murmurem e se levantem contra mim, do que contra Deus. Pouco se me dá, que minha reputação seja passada pela lama, contanto que a honra de Deus nada sofra.

Não havendo quem o defendesse, Deus a si tomou este encargo, e tão numerosos e extraordinários foram os milagres que se dignou de operar por seu servo, que fizeram emudecer as calúnias e maledicências, contra ele levantadas.

O fim da vida de S. Bernardo foi a época, para a qual Deus lhe reservou outros padecimentos. Enfraquecido como estava seu organismo, foram quase insuportáveis os sofrimentos, que lhe causavam as constantes dores de estômago, sem haver uma possibilidade de mitiga-las. Bernardo, na doença, deu a todos o exemplo da mais perfeita paciência e de completa conformidade com a vontade de Deus. Bem a tempo recebeu os santos Sacramentos dos moribundos. Muitas e distintíssimas eram as visitas que recebia. Aos visitantes dizia: “Sou um servo inútil. É hora que uma árvore tão ruim, velha e imprestável, seja cortada e inutilizada. Os elogios que me tecem, não passam de louvaminhas; não sou vaidoso assim, de tomá-las por dinheiro à vista. Sou uma criatura inútil, cuja vida não tem dignidade nem do sacerdócio, nem do eremita”.

Com o olhar elevado ao céu, na presença dos confrades, que lhe lastimavam a morte, e entre lágrimas e soluços, davam demonstração de dor profunda, Bernardo entregou a alma ao Criador, em 1153, contando 64 anos de idade. Dezesseis mosteiros foram por ele fundados.

Inestimáveis foram os serviços que o santo religioso prestou à causa de Deus, em prol da Igreja e pela salvação das almas.

Passaram-se apenas 12 anos depois de sua morte, e o Papa Alexandre III proclamou-lhe a canonização. Pio VIII, em 1830, lhe concedeu o título de Doutor da Igreja.

REFLEXÕES

Muitas coisas da vida de S. Bernardo se nos apresentam como imitáveis e úteis.

1. Bernardo prefere sofrer e até morrer, a recorrer a remedias de feiticeiros e benzedores. Que é o espiritismo? Não é uma superstição das mais grosseiras que existem? Pode ser lícito ao católico recorrer às praxes de uma seita diabólica, como é o espiritismo, para achar alivio nos sofrimentos? Não deve ser nosso lema: “antes sofrer e até morrer”, do que aceitar as drogas de bruxaria, que é o espiritismo?

2. Bernardo chama de ladrões àqueles que lhe querem roubar a inocência e afugenta-os com seus gritos. Quem te tentar para um pecado, é ladrão de tua alma, é assassino de tua inocência. Com o ladrão, com o assassino não se brinca; conhecendo-os como tais, em vez de se entreter com eles, é preciso gritar por socorro e defender-se até o sangue.

3. Bernardo condena-se a penitências crudelíssimas e implacáveis, por causa de uma pequena falta que cometera, por fixar o olhar em um objeto indecente. A medida por ele tomada, não nos deixa em dúvida sobre o perigo, que via, na liberdade que se dá à vista. Que diremos de tantos olhares frívolos, levianos, que pessoas de ambos os sexos se permitem, sem o menor escrúpulo, sem medir as consequências funestas, que geralmente tais liberdades trazem?

4. Bernardo procura vocações religiosas e sacerdotais. Um fervoroso servidor de Deus não se contenta com sua vocação; tudo faz para ganhar novos candidatos ao sacerdócio e à vida religiosa.

5. Ad quid venisti, Bernarde? Para que vieste, Bernardo – era a pergunta que o nosso Santo muitas vezes a si dirigia. Igual pergunta, se a fizéssemos a nós, muito contribuiria para nos animar e afervorar no serviço de Deus, na resistência às tentações e na prática das virtudes.

6. Como S. Bernardo, não nos devemos deixar desencorajar nas adversidades e nos sofrimentos. Deixemos os outros falar e divertir-se à nossa custa e soframos resignados, lembrando-nos dos nossos pecados.

7. A exemplo de S. Bernardo, devemos formar a nosso respeito uma opinião bem modesta e não permitir ao nosso orgulho, à nossa vaidade, que formemos de nós um conceito que esteja em contradição com a verdade.

8. Ilimitada era a confiança de S. Bernardo na intercessão de Nossa Senhora. O “Memorare” (Lembrai-vos) é a expressão exata desta devoção, desta confiança. A Maria Santíssima recorramos sempre, em todas as necessidades de corpo e alma, certos de que a Mãe de Jesus será também a nossa.

Na Luz Perpétua, Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus para todos dos dias do ano, apresentadas ao povo cristão por João Batista Lehmann, Sacerdote da Congregação do Verbo Divino, Volume II, 1935.

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