Mês das Almas do Purgatório: 6º dia – A justiça divina em seus castigos

MÊS DAS ALMAS DO PURGATÓRIO

SEXTO DIA

A justiça divina em seus castigos

MEDITAÇÃO

I. Tendo as santas almas do purgatório triunfado, em vida, do seu infernal inimigo, não seria justo que, depois da morte, lhe caíssem entre as mãos para serem por ele atormentadas. Se Deus permite que os próprios justos sejam neste mundo atormentados e tentados por aquele maligno espírito, não o permite depois da morte, porque esta vida é um tempo de combates e de provas, ao passo que a outra é o fim e a recompensa.

É, portanto, Deus que acende e conserva o fogo do purgatório, no qual são punidos e purificados aqueles escolhidos da graça; e ainda que Deus os ame ternamente, faz-lhes contudo sofrer os mais rigorosos efeitos da sua justiça. Como ousaremos nós queixar-nos, se, de vez em quando, nos manda Deus qualquer tribulação?

II. Diz um profeta que Deus está no fogo, e que, assim como um artista funde e purifica o ouro e a prata no cadinho, para os vasar em seguida na forma e fazer sair dela uma obra prima, assim o Senhor purifica os filhos de Levi nas chamas da prisão abrasada, para os tornar dignos de si; compara-o ainda a um escultor hábil, que não cessa de passar o cinzel sobre o mármore, redobrando os golpes até imprimir nele a imagem do original que quer reproduzir: assim , diz ele, redobra Deus os golpes da sua inexorável justiça sobre as almas aflitas, até imprimir nelas uma imagem da sua perfeição divina, que as torne dignas da eterna glória do paraíso: porque sem um tesouro de merecimentos e uma perfeição consumada, não se entra no céu. E que fazemos nós para nos tornarmos dignos dele?

III. É para as almas um título de distinção e complacência, o não serem atormentadas no purgatório pelos demônios; mas sentem tanto mais vivos os golpes do flagelo que as fere, quanto sabem que são castigadas pela mão daquele Deus que é todo o seu amor. Senhor, exclamam elas, nós vos agradecemos a misericórdia que nos preserva das garras do infernal dragão; mas, ah! quanto nos é doloroso vermos impressa em vosso rosto a severidade do juiz, em vez do sorriso de pai; quanto nos é cruel o recebermos das vossas mãos vingadores golpes, em vez do abraço do esposo. A misericórdia converteu-se em justiça, e sentimos apenas os rasgos da vossa justa cólera. Ó Pai! ó Juiz! ó Vingador! ó Esposo! ah! tende piedade daqueles que não amam nem querem senão a vós.

SÚPLICA

Atendei, Senhor, escutai as vozes das vossas filhas queridas. Restitui ao vosso rosto a doçura e a serenidade; que um raio de graça e de clemência brilhe em vossos olhos; que a vossa mão deponha a vara do rigor e da cólera; e, por um daqueles rasgos de bondade que vos fazem reconhecer pelo Deus das misericórdias, levai aquelas almas, que padecem, ao lugar da vossa eterna bem-aventurança. É esse todo o seu desejo, que é também o nosso. Ouvi as vossas filhas, que vos suplicam; atendei os vossos servos, que por elas intercedem; ouvi o purgatório e a terra, concedendo o céu a este ardente desejo de o possuírem convosco.

EXEMPLO

No convento dos frades menores de Paris morreu um religioso, cognominado Angélico, por causa da sua angélica vida; um doutor em teologia, que fôra seu íntimo confidente, pensando em que a alta perfeição a que ele chegara o levaria a gozar imediatamente da felicidade celeste, absteve-se de celebrar as três Missas que, naquele convento, todos os padres devem oferecer para cada religioso defunto.

Mas quanto erram os homens nos seus juízos! Aquele religioso, considerado tão perfeito, caiu no purgatório, onde não sendo socorrido pelos sufrágios do amigo, do qual esperava as mais fervorosas súplicas, apareceu-lhe uma noite, exprobrando-lhe o seu esquecimento com a expressão da mais viva dor. O doutor, assombrado, desculpou-se, dizendo que jamais pensara que tão grande perfeição tivesse necessidade das expiações do purgatório. Eheu! respondeu aquela alma, nemo credit quam districte judicet Deus et quam severe puniat! (Ninguém compreende a severidade dos juízos de Deus, nem o rigor dos seus castigos). Os próprios céus não são puros a seus olhos! Ele vê defeitos nos espíritos mais puros, e persegue toda a mancha e toda a nódoa com tão rigorosa justiça, que emprega toda a virtude da sua onipotência em purificar as almas no mais vivo fogo, tornando-as assim dignas do paraíso. Estas palavras fizeram com que o religioso se arrependesse da sua negligência, e nos três dias seguintes ofereceu o santo sacrifício por aquela alma com tanto fervor, que conseguiu fazê-la sair do purgatório. Mas se a lição foi útil ao defunto, não o foi menos ao religioso, que desde então trabalhou tão cuidadosamente na sua santificação, que de sublime intérprete dos divinos mistérios, tornou-se um modelo vivo de perfeição cristã. Que esta lição nos guie também à santidade, e nos chame ao mais exato cumprimento dos nossos deveres. (Fr. Maurus ab Ulyssip. in chronic. min. p. 2, liv. IV, cap. 7).

SUFRÁGIO

A vontade de Deus é que se paguem as dívidas que os defuntos contraíram para com ele, na medida do perdão que devemos conceder àqueles que nos ofenderam.

Uma rica viúva de Bolonha, cujo filho fôra morto por um estrangeiro, conseguira fazer prender o matador. Não só o protegeu contra a justiça, mas até o fez seu herdeiro em lugar do filho que perdera. Este nobre rasgo de um coração magnânimo agradou de tal maneira ao Senhor, que imediatamente livrou do purgatório o jovem defunto, o qual, subindo ao céu, se mostrou à sua piedosa mãe, em toda a sua alegria e glória. A justiça de Deus é inflexível, mas jamais se deixa ele vencer em generosidade. Se queremos que ele perdoe às almas do purgatório as suas dívidas e que as admita no seu celeste palácio, comecemos por perdoar aos nossos inimigos, admitindo-os à nossa intimidade; Deus não deixará de retribuir perdão, amor por amor. Que o nosso exercício deste seja, pois, o reconciliarmo-nos com os nossos inimigos, se os temos, por intenção das almas do purgatório. (Nicius Erythreus, Ex. 8).

O Anjo Consolador – Piedosos exercícios, Leituras e Orações Dedicadas a Veneração das almas do Purgatório, compiladas por E. Da S. V. Redentorista, 1939.

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